NOTÍCIAS SOBRE A PRIVATIZAÇÃO
OPINIÃO DO CONSELHEIRO
O Conselheiro Eleito,
representante dos trabalhadores, recebeu nas últimas semanas inúmeras mensagens
de empregados e ex-empregados da ECT, acerca das manifestações de autoridades
sobre a privatização dos Correios, em especial do secretário de Desestatização
e Desinvestimento do Ministério da Economia.
Sobre o tema, cabem algumas
reflexões:
Inicialmente, causa espécie uma
das afirmações do referido secretário de que apenas 3 (três) empresas
continuariam sendo estatais, como se em tão pouco tempo do novo governo já
houvesse sido realizado completo mapeamento das 134 empresa estatais federais e
dos seus respectivos mercados de atuação, a ponto de se ter um quadro
conclusivo de viabilidade econômico-financeira de cada uma das referidas
empresas e dos seus eventuais processos de privatização.
Importante informar que,
conforme levantamento realizado pela OCDE, com dados de 2015, países
desenvolvidos como Alemanha e França tinham, respectivamente, 71 e 51 empresas
estatais federais. Mesmo a Inglaterra e os Estados Unidos, que passaram por
rigorosas gestões neoliberais nos anos 80, com vigorosos processos de
privatização, mantinham cada um 16 empresas estatais federais.
Assim, não se pode considerar
razoável, que em apenas 4 (quatro) anos, o governo pretenda transformar o
Brasil no novo paradigma dos mercados liberais, com a menor presença do Estado
na economia do que nos principais países do mundo. Ainda mais se forem
observadas as nossas gigantescas diferenças de infraestrutura e de
desenvolvimento em relação a esses países, além das assimetrias internas e
necessidades de fomento para diversos setores no país.
No que concerne especificamente
à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), à qual o Secretário
referiu-se anteriormente como “máquina de ineficiência e corrupção”, cabe
inicialmente destacar trecho do artigo de Luiz Carlos Borges da Silveira, sob o
título “Foro privilegiado, corruptos e corruptores”, publicado no jornal Estado
de São Paulo, no dia 15/07/2018:
Sabidamente,
a maior parte dos atos de corrupção vem das empresas, das grandes e organizadas
corporações que tomaram de assalto o estado brasileiro, evidentemente, com a
conivência e associação a maus políticos, desonestos gestores públicos e
dirigentes de estatais e organismos governamentais. Porém, só temos, via de
regra, foco nos corruptos, deixando de lado os corruptores – com algumas
exceções agora na Lava Jato.
Portanto,
é sabido que para prosperar a corrupção é obrigatória a existência dessas duas
partes, a que corrompe e a que se deixa corromper, sendo primário o raciocínio
de que enquanto houver corruptores haverá corruptos dispostos a delinquir em
prejuízo do estado minando recursos que poderiam estar sendo empregados em
favor da população, notoriamente carente em assistência governamental.
A máquina de corrupção não se
encontra na ECT: Encontra-se na captura de agentes públicos (que são indicados
por políticos) e políticos (que são eleitos pelo conjunto da sociedade e não
pelos empregados das estatais) por interesses privados de grandes corporações.
A resposta a esse problema é a profissionalização, não a privatização.
Como se sabe, a corrupção
sistêmica produz diversos resultados, às vezes intencionais, que afetam o
desempenho das organizações, sejam elas públicas ou privadas. Assim, eventuais
ineficiências precisam ser compreendidas como efeitos e não como causas a
justificarem a privatização de qualquer empresa pública.
No caso da ECT, é importante
destacar que a Empresa vem-se mantendo, nos seus 50 anos de criação, como uma
estatal não dependente do Tesouro Nacional. As dificuldades
econômico-financeiras observadas nos últimos anos decorrem, conforme apontou a
CGU, de um conjunto de fatores já amplamente divulgados, destacando-se a
recolhimento excessivo de dividendos para a União, que comprometeu a capacidade
de investimento da Empresa; o congelamento tarifário durante dois anos; e a
flexibilização de critérios para acesso as funções de confiança, que favoreceu
o aparelhamento político-partidário.
Tem o referido Secretário feito
uma veemente defesa da privatização da ECT, e afirmado que não faz sentido o
Estado ter participação na atividade de Correios. Não se sabe quais são as
referências adotadas pelo secretário, mas conforme dados da União Postal
Universal – UPU, de 2017, dos 192 países que compõem a entidade, apenas 8
(oito) países têm a empresa de Correios 100% privatizada. No total, apenas 18
países têm participação do capital privado nas empresas de Correios, incluindo
as empresas já privatizadas.
Conforme se observa, em nenhum
país com as dimensões territoriais e, portanto, com os grandiosos desafios de
universalização dos serviços postais, houve a iniciativa de privatização das
suas empresas públicas de Correios. Mesmo os Estados Unidos, que dispunha de
apenas 16 empresas estatais federais, como já afirmado, tem dentre elas a USPS
- Correio Americano - empresa pública de capital fechado.
Os Correios, como um serviço
relativo à infraestrutura, promovem a integração econômica e social dos países,
fomentando e facilitando as transações econômicas da sociedade, integrando
mensagens de publicidade com mensagens transacionais, distribuindo mercadorias,
documentos, processando cobranças, pagamentos e provendo logística completa
para a sociedade em geral.
Ocorre que muitas dessas
operações, executadas em regime público e com deveres de universalização, são
estruturalmente deficitárias, não sendo executadas pelos operadores privados em
regime de livre concorrência porque não há interesse econômico. Portanto, é
predominante a participação do Estado nas empresas de Correios em todo o mundo,
de forma a assegurar o amplo acesso da sociedade aos serviços postais.
Afinal, os custos da
universalização dos serviços postais são integralmente assumidos pela ECT,
sendo que na grande maioria dos países os referidos custos são cobertos pelo
estabelecimento de uma área de reserva para o operador; por um fundo de
financiamento dos serviços universais, com a contribuição de todos os
operadores privados; ou com o repasse direto do tesouro nacional.
Assim, antes de formar opiniões
precipitadas sobre a participação do Estado na atividade de Correios, seria
recomendado que o Secretário efetivamente compreende-se a natureza dos serviços
postais e a estrutura da indústria postal no Brasil e no mundo.
Urge, assim, que. sem apego a
ideologias, busquem-se as experiências internacionais em relação ao assunto,
analisando-se inclusive os casos mal sucedidos de privatização, a exemplo do
que ocorreu na Argentina, e os casos bem sucedidos de capitalização das
empresas de Correios, como aconteceu com o Deutsche Post (Correio alemão).
No âmbito interno, deveria
compreender que, conforme entendimento do STF na ADPF 46, o serviço postal não
consubstancia uma atividade econômica em sentido estrito: serviço postal é
serviço público. Portanto, devem ser observadas as características de
universalidade e de continuidade dos referidos serviços: em todo o território
nacional, a todo cidadão e a preços acessíveis.
Já o setor postal brasileiro
hoje é composto por um operador público (ECT) e por diversos operadores
privados, nacionais e estrangeiros. O segmento de encomendas, por exemplo,
conta com cerca de 200 (duzentos) operadores privados, dentre eles os
principais players do mercado internacional, sendo que inexiste
monopólio ou área reservada para a prestação dos referidos serviços, como
equivocadamente querem fazer crer.
Portanto, antes de uma
definição precipitada sobre a natureza do controle do operador público, faz-se
necessário o estudo sobre o atual modelo regulatório do setor postal
brasileiro, que apresenta uma
regulamentação em desconformidade com as novas relações (jurídicas e
econômicas) e com a crescente e inevitável densidade de serviços oferecidos em
escala mundial pelos agentes privados atuantes no setor.
Com efeito, os diversos
operadores privados do setor atuam sem nenhuma regulamentação e sem qualquer
fiscalização. Não existem normas de execução dos serviços, padrões de qualidade
a serem atendidos e nem obrigações de continuidade e de universalidade para
esses operadores, embora os serviços postais sejam constitucionalmente
definidos como serviços públicos, em sentido estrito.
É preciso, portanto, contribuir
para a discussão acerca de um novo marco regulatório compreensivo dessa nova
geração de serviços e da atuação desses novos players, que, sem excluir
o papel essencial e histórico do operador público, ofereça suprimentos e
complementação de relevante utilidade pública para o intercâmbio de informações
e serviços em nível nacional e transnacional.
Afinal, o aperfeiçoamento do
setor postal brasileiro não virá apenas com os dogmas e mantras do utopia
liberal do “Estado mínimo”, repetidos ad nauseam para uma plateia ávida
pelo discurso de privatização, a panaceia que se propõe a curar todos os males
do Estado brasileiro. Pois como afirmou Montaigne, em seus ensaios sobre a
vaidade, “ninguém está livre de dizer tolices: o imperdoável é dizê-las
solenemente”.
No entanto, cabe a todos nós,
dirigentes e trabalhadores da ECT, a responsabilidade de contribuir de forma
decisiva para o processo em curso de recuperação da qualidade operacional, da
condição econômico-financeira da Empresa e da sua confiança perante a sociedade
brasileira.
Certamente, os nossos
resultados falarão mais alto do que as nossas opiniões.
MAURÍCIO FORTES GARCIA
LORENZO
Conselheiro
Conselheiro